segunda-feira, 4 de junho de 2012

Sobre preconceito.

Difícil falar sobre preconceito com um olhar puro, já que preconceito significa conceito pré-concebido e pré-conceber é atividade essencial para nos manter vivo. Tem a ver com preservação de espécie, com defesa, com categorização. Porém, quando o preconceito começa a se tornar perigoso? Na minha opinião, é quando começamos a conviver abertamente, conscientemente com ele e a aceitá-lo como fator discriminador. Há algum tempo eu achava que o machismo, o racismo e a homofobia, por serem mais “conhecidos”, ou seja, estarem mais presentes no senso comum, estavam mesmo caminhando pra erradicação no futuro. Mas mudei de opinião, acho que estamos caminhando para a aceitação da discriminação. Quando ouço alguém falar “não sou homofóbico, até tenho um amigo gay”, na hora me vem à mente alguns filmes pós-apartheid, onde os brancos que na época queriam ser politicamente corretos contratavam os negros, mas não os deixavam comer nas suas louças, usarem seus banheiros, conversarem na sua frente. Precisavam conviver, mas não queriam. As mesmas pessoas que dizem ter amigos gays fogem dos locais onde existem gays. Fazem piadas diariamente sobre a orientação sexual deles. No fundo, não querem estar perto: o que os amigos vão pensar? Pior ainda são as pessoas que falam em “surto gay” como “moda”. Como se a maioria decidisse enfrentar a sociedade e sua família, correr o risco de apanhar e de ser motivo de piada na rua, só por modismo. Quando comparo a discriminação aos negros daquela época com os gays de hoje, algumas vezes ouço: “é diferente, me mantenho longe de gays porque não quero ser abordado por eles”. Digo: “você convive com mulheres, quantas te abordam diariamente querendo sexo? E se abordassem e você não quisesse, você somente recusaria, certo? O problema é realmente este?” Acho improvável que a homofobia diminua enquanto ainda acharmos que pobre é melhor/pior que rico, que mulher é pior/melhor que homem, que negro é pior/melhor que branco, que nordestino é melhor/pior que paulista. E principalmente, enquanto continuarmos generalizando TUDO. Sim, existem categorias de pessoas com variáveis em comum, as quais criamos para pertencer, para nos sentirmos parte de algo. Mas existem pessoas, com seus sentimentos únicos, reações peculiares, pensamentos indescritíveis dentro destas categorias. Estamos aos poucos nos esquecendo disto! O pior de tudo é a falta de questionamento, de pensamento crítico, não contra as pessoas e sim contra o sistema que nos rodeia, aquele que possibilita esse nosso moderno apartheid. Estamos imbecilizados, estamos nos separando quando deveríamos estar nos juntando contra coisas que realmente são ruins: a corrupção, a mentira, a banalização da violência, o caos moderno. A segregação barulhenta ainda é menos pior do que a silenciosa, aquela que não percebemos e que, com o passar dos anos, se instala, apoiada/criada muitas vezes pela mídia. Alguém aí tem um amigo ou amiga obesa? Sabe o quanto de discriminação ela sofre? E ainda é apontado como culpada pelas suas mazelas, porque “quem come o que quer tem que agüentar as conseqüências”, já disse alguém. Sou mulher, sou 100% a favor do amor entre quaisquer gêneros, não acho que a diferença está nas raças, na orientação ou na religião, está no subjetivo. Todos somos únicos. Todos temos um pouco de negro, de europeu, de gay (simmm), de rico, de nordestino, de gordo, do que for. Vamos começar a aceitar?

terça-feira, 17 de abril de 2012

Conto Não Tão Infantil

Ele tinha 11 anos quando começou a considerar o sexo feminino algo interessante e não inútil como até então. Sua mãe sempre dizia que ele ia casar e ter filhos mas ele nunca entendeu o porquê disto, já que por conta de sua ingenuidade infantil, pensava que seria criança, livre e feliz para sempre.

Quando fez 12, seu irmão de 19 mentiu dizendo que iam ao cinema e o levou ao prostíbulo, único lugar onde ele ainda não havia explorado naquela cidade interiorana onde todos se conheciam. Lá dentro, sentiu cheiro de tabaco, pinga e de segredos. Seu irmão parecia conhecer todas as mulheres, algumas das quais sentiu nojo e achou bem velhas. O irmão chamou o nome “Lisbete” e lá de longe ele avistou, saindo detrás do balcão, uma imagem angelical, loira e maquiada como nas revistas de sua mãe. Ela não devia ter mais de 15 anos, calculou, enquanto sentia calafrios de pensar no que fazer com ela quando subissem...sabia que teriam que subir.

Subiram. Perto do ouvido dele, ela disse “pode me chamar como quiser, mas sou Lili”. E foi se despindo. Ele a copiou. Ela disse, apontando pro lado “tá vendo aquela janela, é por ali que vamos fugir depois que você virar homem, hoje”. Ele, já perdido em seu turbilhão de hormônios adolescentes, concordou, sem sequer entender.

Quando acordou do transe, ela já estava juntando alguns panos e pedindo a ajuda de Deus para que não morressem ao cair da janela. Pulou. Ele, de novo e sem pensar, a copiou. Estava apaixonado.

Iriam pra casa do primo da mãe dela, paixão antiga, ela descobriu. Quando a mãe morreu de tuberculose há três anos atrás, não conseguiu ter forças para ir além daquele lugar, mas não agora, agora ela tinha alguém. Ele era tudo que ela queria ter sido, feliz, ingênuo, cuidado, simples, vivo. Ela estava morta por dentro, mais morta que a mãe, pensava, mas não hoje, não mais.

Estavam sorrindo. Ele fora para um dia voltar, ela pra nunca mais. A paixão decidiria o resto.